_Não importa quão boa uma prancha é, irá sempre haver uma melhor_

28-08-2015

 

Com uma experiência de 43 anos a transformar blocos de foam em refinadas pranchas de alta performance, o havaiano Glenn Pang vem pela primeira vez a Portugal no próximo mês, para uma temporada sob o teto da Xhapeland.

 

Discípulo de Ben Aipa e Dick Brewer, dois nomes incontornáveis da Shortboard Revolution, Glenn fez parte da equipa que nos anos 80 ajudou a construir a lenda da Town & Country, marca de pranchas, surfwear e acessórios sediada em Pearl City (Oahu, Havai). Trabalhando com os atletas que faziam então parte do poderoso team da T&C, como Martin Potter, Marvin Foster e Denton Miyamura, Pang rapidamente se tornou num dos nomes mais requisitados pelos surfistas internacionais que, todos os invernos, desembarcavam em Oahu para se pôr à prova nas impiedosas ondas do North Shore.

 

O facto de o seu nome ser relativamente desconhecido só é explicado pela aversão aos holofotes que sempre o levou a preferir trabalhar nos bastidores, já que do seu currículo fazem parte surfistas como Andy Irons, Jake Patterson, Taj Burrow, Matt Archbold, Richard "Dog" Marsh, Kieren Perrow, Mick Lowe, Bede Durbidge e Kekoa Bacalso, entre outros, para além de algumas das melhores surfistas do mundo, como Carissa Moore, Coco Ho, Sally Fitzgibbons e Laura Enever.

 

Glenn estará em Portugal durante o mês de setembro - chega dia 5 -, produzindo pranchas e colocando todo o seu conhecimento e experiência à disposição dos surfistas europeus. Na entrevista que se segue, vais ficar a conhecer melhor a filosofia de shape do mestre havaiano e as razões pelas quais vais desejar começar a preparar o teu quiver de inverno com ele.

 

SURFPortugal – Qual é o papel do shaper em relação aos seus clientes: dar forma aos seus sonhos ou elevar os seus sonhos a um novo patamar?

 

Glenn Pang: Não importa quão boa uma prancha é, irá sempre haver uma melhor. Independentemente do tipo de prancha, pode sempre haver melhorias. O shape personalizado para clientes varia, dependendo de quem é o cliente. É importante saber quem eles são e as suas capacidades de desempenho [nas ondas] — é isso que me permite fazer aquilo que eles procuram e que estão à espera de receber ou, se estiverem abertos a isso, tentar elevar o seu surf a um novo patamar.

 

SP – Nesta era do shape mecanizado de alta qualidade, que espaço sobra para a sensibilidade e para o detalhe, que podem fazer grandes diferenças no design?

 

GP: Antes da era das máquinas, nós nunca conseguíamos acompanhar a procura. Grande parte do tempo era gasta na mecânica de simplesmente aproximar o blank daquilo que o design final seria. Agora, com a ajuda dos programas de design CAD, a maior parte do meu tempo é dedicada ao design das pranchas e ao seu refinamento.

 

SP – Como é que a tua experiência como surfista afeta a forma como shapas e pensas sobre a performance de uma prancha?

 

GP: Continuo a surfar com todos os meus designs, exceto talvez com as guns (deixo isso para os mais novos). Quando tenho um novo conceito de design, primeiro testo-o eu próprio e depois, se for aprovado por mim, passo-o a um dos nossos riders, e assim por diante. Toda a gente surfa de forma diferente e gosta de coisas diferentes numa prancha, por isso quanto mais feedback tiver, melhor. A maioria das minhas pranchas são "estreias", estou sempre a experimentar algo novo.

 

SP – O Havai, e especificamente o North Shore, tem desempenhado um papel importante nos diferentes estágios da evolução das pranchas, funcionando ora como um "laboratório" de ideias ora como o campo de testes definitivo para projetos concebidos noutros lugares. Achas que isso ainda é uma realidade no mundo moderno? Como vês a importância do Havai na indústria do shape?

 

GP: Sem dúvida, o Havai tem desempenhado um papel importante na evolução das pranchas de surf. Hoje já não é tanto assim ao nível das pranchas mais pequenas, mas o Havai continua a ser determinante quando se trata de pranchas maiores e guns. Afinal, continuamos a ter as condições de ondas grandes mais consistentes. Claro que há outros lugares no mundo que têm ondas grandes, mas aqui no Havai temos esse tipo de condições durante vários meses. Os melhores [surfistas] continuam a vir cá para o nosso inverno e muitos deles adquirem pranchas de shapers locais, o que nos permite desenvolver e refinar novos designs.

 

"Estou sempre à procura de coisas novas que contribuam para o desenvolvimento e refinamento das pranchas"

 

SP – Quais são, para ti, as áreas mais interessantes de desenvolvimento do shape neste momento? É a colocação de fins, o ajuste dos rails, os contornos do fundo?

 

GP: Estou sempre à procura de coisas novas que contribuam para o desenvolvimento e refinamento das pranchas. O design continua a ser o mais excitante e gratificante para mim. Sempre que tenho uma ideia nova, desenho-a no CAD (Shape 3D) e corto-a na máquina (APS). Às vezes resulta, outras não. Nunca sabes enquanto não experimentares.


SP – Como é que a evolução dos materiais afetou a fabricação de pranchas nos anos mais recentes?

 

GP: Há tanta coisa a acontecer no desenvolvimento das pranchas neste momento... Novos materiais interiores de base (Varial), novos materiais exteriores e técnicas de fibragem, etc. Estamos sempre à procura da próxima coisa que vai revolucionar a fabricação de pranchas. Diferentes materiais afetam o desempenho da prancha de maneiras diferentes. Durabilidade, flexibilidade, flutuabilidade — tudo isto muda quando são usados materiais diferentes na construção de uma prancha.

 

SP – Fala-nos da diferença entre o shape de produção geral e o shape personalizado. O que preferes?

 

GP: Com toda a certeza, o shape personalizado é mais gratificante e mais desafiante. Tentar encontrar a prancha perfeita para aquele surfista, por vezes, não é o mais fácil. Fazer a mesma prancha uma e outra vez pode tornar-se um pouco aborrecido ao fim de algum tempo.

 

SP – Hoje em dia, com que frequência shapas uma prancha à mão do princípio ao fim? Ainda gostas disso?

 

GP: Raramente. Cheguei a um ponto em que as minhas ideias podem ser melhor traduzidas através do CAD e cortadas na máquina. Essa sintonia é determinante no processo de design. Prefiro a consistência das pranchas desenhadas e cortadas à máquina.

 

SP – Há uma tendência para identificar os shapers havaianos como experientes shapers de guns. Quanto disto é verdade e quanto é apenas mito?

 

GP: O Havai sempre esteve associado ao surf de ondas grandes. Este é o lugar onde o surf de ondas grandes começou e se refinou ao longo dos tempos. Os shapers havaianos tiveram mais tempo para refinar as suas guns, uma vez que o Havai tem sido o centro nevrálgico do surf de ondas grandes há tanto tempo. Recentemente, mais e mais spots de ondas grandes à volta do mundo têm sido surfados, e tenho a certeza que os shapers locais estão a especializar-se cada vez mais em guns.

 

SP – Esta vai ser a tua primeira visita à Europa? Quais são as tuas expetativas?

 

GP: Só estive na Europa (França) uma vez antes. Tenho ouvido falar muito sobre Portugal e já conheço ótimas pessoas aí. Tenho a certeza que [o país] vai ter coisas surpreendentes a oferecer.

 
 
 
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